quinta-feira, 13 de julho de 2006

Aproveitando o Dia Internacional do Rock, que foi ontem...




Pra quem não sabe, este é Syd Barret, que morreu nesta semana. Lá pelos idos dos anos 60, este cara foi um dos agitadores da cena underground londrina. No meio da onda psicodélica que reinou a partir de 66, Syd fundou o Pink Floyd, uma das maiores coisas que já existiram em termos de música no século XX. Em 67 a banda gravou "The Piper at The Gates of the Dawn", quase porta com porta com os Beatles, que gravavam o seu "Sgt. Peppers" ali no mesmo estúdio, o Abbey Road. Enquanto os Beatles atingiam o seu ápice, aquele era o ponto de partida do Pink Floyd, o que abriria as portas para o que anos depois se tornaria o Rock Progressivo. Mas Syd não chegou a esta etapa. Gravou o primeiro disco, participou do segundo, gravou ainda uns discos solo e depois a saúde debilitada pelas drogas o afastou de tudo e de todos. Apesar disso, ele continuou presente de alguma forma, inspirando dois discos do Pink Floyd já na metade dos anos 70 ("Dark Side of The Moon" e "Wish you were here", este literalmente dirigido a ele). Pois é, depois de Arelia, Carequinha, Golias e Bussunda, mais um grande que 2006 levou. E olhe que só estamos em julho...

:::The lunatic is on the grass...

quarta-feira, 21 de junho de 2006

Em cima do céu um vago no chão


Agora você se vê no direito
De me levar ao inferno.
Porque ao céu você já me levou
E foi como um sonho de Rimbaud
Quando à beira de perder a fé
Eu te beijei com olhos coloridos
E caí bêbado como Baudelaire.

Te apertava contra o peito
Foi o meu abraço mais terno.
Esperei, mas você não notou
Quando nem o céu se agüentou
Largou uma lágrima feito mulher
E depois de tanto ter torcido
Me via voltando sozinho a pé.

O mundo me sorria sem jeito
Tentando serenar meu inverno
Mas na janela, a roseira secou
Foi então que o outono chegou
Pra te deixar ser o que é:
Um pedaço dos meus passados
Escondidos
E eu já não tenho um futuro
Sequer.

quinta-feira, 1 de junho de 2006

Banda Gauche, de João Pessoa, lança EP com pop-progressivo

A banda Gauche, de João Pessoa, acaba de lançar um EP com quatro músicas gravadas ao vivo em estúdio. As músicas foram gravadas em março deste ano, e lançadas pelo selo paraibano-pernambucano Musicland Records. O combo pessoense de pop progressivo surgiu em 2003, pelas mãos de Bruno Sérgio (voz, teclados e violão), então integrante do The Silvias, junto com Luis Venceslau (guitarra), Paulo "Gauche" Victor (bateria) e Tom "Ramone" Alves (baixo); formação atual e definitiva.

O disco abre com 'Teatro de Serafins' "com orientação psicodélica, que remete às melodias e ao lirismo do Violeta de Outono", descreve o jornalista Jesuíno André, que apresenta o trabalho. Na seqüência, continua ele, "em 'O Palhaço', como o próprio título sugere, a levada é toda circense. 'Primavera' é uma balada em forma de doce lamento, boa prova da diversidade melódica/harmônica do grupo. Fechando com 'Seja Onde For' uma canção curta com intensidade crescente e um guitarra com timbragem similar a de Mark Knopler".

Em suas influências, "Gauche traz sons que vão da psicodelia folk-pop anos 60 até as tendências retro-progressivas atualizadas, e é nesse balaio que podemos citar Violeta de Outono, Echo and The Bunymen, Byrds e Mopho, como bons exemplos para situarmos a escola da banda", diz Jesuíno André. "Longe de serem estranhos, a possibilidade de desenvolverem uma musicalidade envolvente e consistente é infinita. Vale uma prova".

fonte: Senhor F

Clique aqui para ouvir a banda.

segunda-feira, 22 de maio de 2006

A última véspera


Dezembro veio como um cavalo rampante, destrambelhado como o rompante de um trem chegando na estação. Por cima dos canaviais, chegara àquela casa o vento da sua desgraça, trazendo os ecos de todos os maus agouros acumulados em todos aqueles anos de letargo. Enquanto as caravanas de ex-vizinhos passavam defronte à varanda, na sala engendrava-se o plano de suas vidas. Mas por ver a vida de perto desde cedo, a mãe não conseguia embarcar naquela vã obstinação. Com horror, via que eles levariam a termo toda aquela resignação: a alucinação do pai encontrara terreno fértil na impulsividade dos filhos.

A folhinha dos dias parara no dia em que chegara a notícia de que, pelo bem dos negócios da usina, a família teria algumas semanas para se relocar, deixando o terreno livre para o trabalho das máquinas. Foi assim que o tempo se acabou e não houve mais vida. Tudo convertera-se numa espera insone, só falava sobre o dia, só se comia pensando no dia, só se olhavam com vontade de que esse último dia do ultimato não chegasse nunca.

No entardecer da véspera, a milícia começava a se reunir ao longe. Isso porque ao amanhecer tudo já deveria estar pronto para que se coibisse qualquer oposição à decisão da usina. Contra a luz do crepúsculo trêmulo, a visão dos arautos da guerra foi o sinal definitivo para a mãe. Munida com sua autoridade tácita, e de posse de uns tantos sentimentos extremos, teve lucidez para reconhecer que só cabia a ela o ato magnânimo do sacrifício, e como toda a paz do seu espírito, pôde realizar o seu intento mais extremo: distribuiu bolinhas de estricnina nos pratos da janta, e encerrou o assunto sem que houvesse um disparo.

segunda-feira, 1 de maio de 2006

Carne de pescoço

No momento que viu a gaiola com o menino dentro, Carmelita esqueceu-se de tudo. Esqueceu das mais de seis horas de viagem, do ônibus caquético que lhe trouxera até ali, de sua madrinha que não via havia quase trinta anos, de tudo. A madrinha, indiferente, nem percebeu a consternação em que Carmelita se meteu ao dar com os olhos diáfanos do menino por trás das grades. Ele não tinha o rosto retorcido e aziago dos encarcerados; tinha, sim, traços tão ternos e um semblante tão amável que congestionaram Carmelita como toda a comoção de seus instintos maternais. Apesar da condição, Carmelita não via nele rastros de tristeza, pelo contrário, trazia até uma certa luz no rosto, algo de plácido. Embotada nas palavras, Carmelita perguntou o que significava aquilo e a sua madrinha sem tirar os olhos do bastidor lhe respondeu simplesmente que "era assim mesmo". A crueza da resposta lhe devolveu a razão, e Carmelita quis aprofundar o assunto. Com candura, sua madrinha foi lhe guiando até a porta, recomendando descanso da viagem sofrida e dizendo que depois conversariam mais.

Carmelita intrigou-se mais com a forma como a sua madrinha fugiu da explicação do que propriamente com o menino enjaulado. Já no hotel, perturbou-se quando lembrou de ter visto pratos, cascas e migalhas no chão da gaiola, e ela compreendeu que nem pra comer ele saía dali. Passaram-se alguns dias e Carmelita continuou encontrando o menino dentro gaiola nas vezes que retornou à casa da madrinha. "Mas um castigo não pode durar tanto!", pensava. Nesses dias que se seguiram, viu muita gente passar pela casa de sua madrinha sem que ninguém fizesse menção à presença do menino, sem que sequer olhassem para a gaiola no canto da sala. Depois de algum tempo, e de tanto a sua madrinha evitar o assunto, Carmelita passou a abordar as vizinhas mais freqüentadoras, que lhe davam as mesmas respostas, que "era assim mesmo, minha filha, deixe ele". Depois de algumas noites sem descanso, com a visão torturante dos olhos infantis atrás daquelas grades, Carmelita concluiu que aquelas mulheres eram umas loucas, não ela, e decidiu falar com o padre. Se apresentou, disse que não era da cidade, e perguntou se ele tinha conhecimento da barbaridade que ocorria a poucos metros de sua sacristia. O padre até que vinha lhe ouvindo com boa vontade, mas quando ela falou do menino, ele fez aquela mesma expressão das mulheres, a cara murcha, os olhos baixos, e com um sorriso insosso de falsa gentileza, lhe recomendou que deixasse isso para lá, que não valia a pena tanta preocupação.

Carmelita empertigou-se. Parecia coisa combinada daquele povo. Teve que ir ao delegado, a última instância que poderia recorrer ali, e contou-lhe o caso em detalhes. Após a explanação, ele simplesmente rechaçou-a com o argumento de que não se metia em problemas de família. Já era noite quando Carmelita deixava a delegacia. O acúmulo de decepções atrapalhava seus passos, e a imagem do garoto dentro da gaiola atento aos barulhos da rua lhe desatinou de vez. Correu para a casa da madrinha, foi entrando sem bater, tropeçando em tudo, e não encontrou na sala ninguém além do menino na parte mais escura da gaiola. Trêmula, distinguiu no molho de chaves da porta a chave grosseira que abriria as grades. Quando abriu, a porta deu um pequeno rangido e Carmelita sorrindo entre lágrimas disse ao menino que estava tudo bem, e que ele não tinha mais porque ficar ali.

Na manhã seguinte, encontraram a gaiola vazia e Carmelita num charco de sangue, toda retorcida. Outra vez, a cidade estava metida no terror de meses atrás, quando o sobrinho-neto de dona Lourdes, madrinha da falecida, escapou do quartinho que vivia e feriu de morte várias pessoas. Na época sobrou até para o papagaio do padre, estimado por recitar poemas de Augusto dos Anjos e Patativa do Assaré. Até ele ser pego, porque ninguém atiraria numa criança, a cidade viveu num contínuo desassossego que agora seria retomado. Nem se falou muito de Carmelita, que fora enterrada com o mesmo rosto de surpresa de quando fora morta. Difícil ter outro assunto quando há solto na cidade um menino canibal.

segunda-feira, 17 de abril de 2006

Ficha de cadastro

O meu nome se perdeu nos soluços dela, estraçalhado antes de chegar aos seu lábios. Então com a voz foi-se o nome, e eu nunca mais pude atender direito a quem me chamou depois. Minha identidade era ela, e hoje já não sou idêntico a ninguém. Meu sexo hoje é pago e mal feito. Meu estado civil é saudade, é vontade de extirpar aquele choro velho que ficou decantado em algum lugar em mim. A idade é a mesma da daquele dia, porque a idade pára quando acaba a vida. Também continuo no mesmo endereço incerto das minhas andanças sem chão. Meus telefones ficaram mudos de vez. Minha profissão é empurrar toneladas de horas pra que venha logo a noite seguinte e eu possa brincar de dormir e querer não sonhar. E por fim, encontro o X que marca o lugar numa linha tracejada onde deixo cair a lágrima que me turvava a visão. Deixa assim, vale como assinatura...

segunda-feira, 3 de abril de 2006

Constatação

Somente em determinadas condições é que se pode perceber certas coisas, nem sempre construtivas. Por exemplo, como as novelas da TV Record são ruins. Pra usar uma expressão da moda, é um picolé de chuchu televisivo.

Morada

Quando os homens chegaram , encontraram Dona Lourdes na cozinha, sentada à mesa. A idosa olhava para o quintal, indiferente às grossas rach...